Camila conheceu Ricardo num bar. Passou os olhos longamente pelo seu corpo, digeriu seus gestos e sentiu aquele toquinho de intuição lhe proporcionar arrepios no braço esquerdo.
Estava com medo, mas não segurou: num ataque de ansiedade, correu lhe perguntar da melodia que haviam discutido outro dia.
Passaram a noite toda ignorando os músicos que se esforçavam a serem notados. Os meninos que buscavam as meninas. As meninas que buscavam mais cervejas. As luzes baixas - os olhos um do outro tinham luzes de feitiço, que apagavam tudo ao redor quando entrecruzados.
Camila convidou-o para a sua casa. Ricardo convidou-a para o seu corpo. E dançaram até a tarde do outro dia, entre os lençóis, os suores, os travesseiros e as promessas que os olhos diziam, sem parar, um ao outro.
Passou um dia. E ela o respirava de memória: sentado na mesa da cozinha desenhando, no guardanapo com seu telefone, a placa de “proibido jogar no lixo”.
Após tantos mais dias sem que ele lhe telefonasse, começou a questionar todos os impulsos que a conduziram àquele encontro: não deveria ter se adiantado à aproximação. Deveria ter esperado que ele viesse. Não deveria tê-lo levado à sua casa. Deveria ter esperado mais um pouco. Não deveria ter trepado com ele! O que ele deve estar pensando? Em como ela é fácil? Em como deve fazer isso com qualquer cara que encontra num bar? Que deve ser mais uma piranha. Que nunca iria ligar. Já deveria mesmo ter jogado o guardanapo pela janela do carro, assim que saiu de seu campo de visão...
Um dia, dois dias, duas semanas, um mês. Acaso dá para saber o que se passa na cabeça do outro? Acaso os olhos são, mesmo, portais da alma? E se todo o prazer do mundo foi sentido naquele momento, há ainda como sentir o que ele sentiu?
E, do medo de que o prazer do outro não lhe corresponda – e não lhe corresponda exatamente da forma como se deseja –, a desaprovação de todos os pensamentos, ações, emoções, que a fizeram se deixar invadir, se expor, nua, se entregar... (a ele?)
Não. Não deveria ter feito nada disso. Bancara a boba, de novo. Estava arrependida... reprovando-se, cada pedacinho, por imaginar que o outro a reprovara.
A verdade é que já há algum tempo desatou a permitir que o julgamento que fazia de si tivesse referências externas. E transformou em maldição as palavras do outro. Mesmo aquelas não ditas. Aquelas que eram suas mesmo, disfarçadas de outra pessoa...
Não interessa dizer que o guardanapo, ela mesma o tinha jogado no lixo, assim que haviam acabado de tomar café. E que ele voltava ao seu bairro todo final de semana procurando a casa onde estava a mulher que o encantara, só com o olhar.
Ou apenas que ele era mais um idiota que não entende nada de momentos mágicos e que acha que ela é sim uma vadia por trepar com ele na primeira vez que saíram juntos.
Interessa que numa terça-feira cinza, tristonha, pensou que as melhores lembranças dos últimos tempos eram as deliciosas sensações que percorreram seu corpo durante a manhã que compartilhou com Ricardo. Quando fechava seus olhos, esta manhã a fazia sorrir...
Sorriu. Compreendeu que aquelas horas fizeram brilhar forte algumas de suas partes que esquecia na razão da rotina, na rotina da razão.
Estava com medo, mas não segurou: num ataque de ansiedade, correu lhe perguntar da melodia que haviam discutido outro dia.
Passaram a noite toda ignorando os músicos que se esforçavam a serem notados. Os meninos que buscavam as meninas. As meninas que buscavam mais cervejas. As luzes baixas - os olhos um do outro tinham luzes de feitiço, que apagavam tudo ao redor quando entrecruzados.
Camila convidou-o para a sua casa. Ricardo convidou-a para o seu corpo. E dançaram até a tarde do outro dia, entre os lençóis, os suores, os travesseiros e as promessas que os olhos diziam, sem parar, um ao outro.
Passou um dia. E ela o respirava de memória: sentado na mesa da cozinha desenhando, no guardanapo com seu telefone, a placa de “proibido jogar no lixo”.
Após tantos mais dias sem que ele lhe telefonasse, começou a questionar todos os impulsos que a conduziram àquele encontro: não deveria ter se adiantado à aproximação. Deveria ter esperado que ele viesse. Não deveria tê-lo levado à sua casa. Deveria ter esperado mais um pouco. Não deveria ter trepado com ele! O que ele deve estar pensando? Em como ela é fácil? Em como deve fazer isso com qualquer cara que encontra num bar? Que deve ser mais uma piranha. Que nunca iria ligar. Já deveria mesmo ter jogado o guardanapo pela janela do carro, assim que saiu de seu campo de visão...
Um dia, dois dias, duas semanas, um mês. Acaso dá para saber o que se passa na cabeça do outro? Acaso os olhos são, mesmo, portais da alma? E se todo o prazer do mundo foi sentido naquele momento, há ainda como sentir o que ele sentiu?
E, do medo de que o prazer do outro não lhe corresponda – e não lhe corresponda exatamente da forma como se deseja –, a desaprovação de todos os pensamentos, ações, emoções, que a fizeram se deixar invadir, se expor, nua, se entregar... (a ele?)
Não. Não deveria ter feito nada disso. Bancara a boba, de novo. Estava arrependida... reprovando-se, cada pedacinho, por imaginar que o outro a reprovara.
A verdade é que já há algum tempo desatou a permitir que o julgamento que fazia de si tivesse referências externas. E transformou em maldição as palavras do outro. Mesmo aquelas não ditas. Aquelas que eram suas mesmo, disfarçadas de outra pessoa...
Não interessa dizer que o guardanapo, ela mesma o tinha jogado no lixo, assim que haviam acabado de tomar café. E que ele voltava ao seu bairro todo final de semana procurando a casa onde estava a mulher que o encantara, só com o olhar.
Ou apenas que ele era mais um idiota que não entende nada de momentos mágicos e que acha que ela é sim uma vadia por trepar com ele na primeira vez que saíram juntos.
Interessa que numa terça-feira cinza, tristonha, pensou que as melhores lembranças dos últimos tempos eram as deliciosas sensações que percorreram seu corpo durante a manhã que compartilhou com Ricardo. Quando fechava seus olhos, esta manhã a fazia sorrir...
Sorriu. Compreendeu que aquelas horas fizeram brilhar forte algumas de suas partes que esquecia na razão da rotina, na rotina da razão.
Compreendeu também que não havia entregado nada a Ricardo: havia se exposto a si mesma. E, enfim, se aprovara.
Mari Brasil
6 comentários:
nossa. que trágico!!!
e bonito ao mesmo tempo
melhorou agora??
Eu não sei por que mas eu ainda acredito no amor e na fidelidade. É claro que sempre desconfiamos do outro e às vezes de nós mesmos. Somos ou não capazes de sermos tudo aquilo que o outro quer, precisa, deseja ou obriga? Você falou da incompletude (nesse ou no outro texto, não lembro...) e acredito mesmo nisso. Afinal, estamos sempre à procura de algo que muitas vezes se torna alguém.
Acho que encontrei meu outro e que somos nossas metades (como eu defendi há um tempo atrás, minha metade, minha alma gêmea, e fui crucificada...). Mas enfim, seu texto me fez pensar que tudo o que fazemos nada mais são do que escolhas. E nos resta apenas torcer para que o outro continue nos escolhendo.
A pergunta, pra mim, não é se "somos capazes de ser tudo o que o outro quer". É, pelo contrário, descobrir o que queremos ser. Nós. O que queremos ser? O que é a nossa escolha?
E aí sim, concordo contigo: torcer para que o outro continue nos escolhendo, sendo o que queremos ser...
e, se não nos escolher... bom, aí é chato. a gente fica triste pra caralho, mas... tem tanta gente mais no mundo...
eu escolho ficar comigo! se alguém mais quiser, é mto bem vindo!
p.s.: qualquer dia vou ter q criar coragem pra ir aí te dar um abraço... aliás, tu bem q poderia ir pra cá, né?? beijos!
bem florzinha essa Camila viu?
se ele achar ela piranha pq transou no primeiro encontro , quem nao merece ela é ele.
será q ela achou ele galinha por transar no primeiro encontro?
q pensamentos machistas fora de moda nao?
legal cê assumir isso que a gente pensa... será que ele pensa que sou galinha pq dei de cara? Tem uma legislação extensa sobre isso... rs... rs...
acho q cê acertou na mosca quando disse q a dificuldade maior é o olho do outro espelhado na gente. O inferno é o outro, mesmo.
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