sexta-feira, dezembro 21, 2007

Cerejas de Quinta-Feira


Entre uma e outra abocanhada, elas se partem, esguichando um suquinho vermelho que escorre pela barra do vestido. Está manchado.
Escorre um fio no canto da boca, da mordida suculenta.
Lambo os dedos e penso em desprezar as outras, ali, na caixinha de plástico que agora, enfeita a mesa com sua cor... cereja? – brilhante e sensual.
O sexo, explícito num amontoado de frutinhas.

Basta um olhar para que ele feche sobre si mesmo e se volte para dentro: o lugar dos sonhos.
Nos sonhos, uma tina de cerejas, onde se deite.
[Deito]
E a pele se arrepie do contato com a casca, quase um bilhão de corpos (de cereja) acariciando esse corpo.

Um gesto para o lado e pequenas bolinhas macias pela nuca até os pés...
Cheiros, sucos e paixões.

Volta-se novamente o olhar para o fora: estão lá, no potinho.
Quem sabe só mais uma.
Inteira, estrala.

Mastiga uma e entende a minha saudade...
É d’um carinho do toque das cerejas explodindo no céu da boca.

quarta-feira, dezembro 12, 2007

Aquela outra mulher...


Mesmo sem esperar ela veio e estava acompanhada.
Na madrugada daquele dia tive certeza de que ela estava ali definitivamente, para ficar.
E agora? Será que vamos ficar lado a lado sempre? Às vezes acho que ela está sempre um passo à minha frente. Tenho que correr.
Naqueles olhos vi coisas repetidas e ouvi histórias que já nem sabia mais, cheias de cores, sabores, aromas. Não me perguntei se era real, não me perguntei por realidade. Apenas fiquei ali contemplando aqueles pedaços de histórias que apareciam, dançavam na minha frente e sumiam como fumaça diante dos meus olhos.
Um misto de medo, expectativas, desejos, vontades começou a tomar conta dos olhos. Agora ela me via. Tentei continuar contemplando os pequenos sonhos e lembranças que ainda estavam pelo ar, já era tarde. Era hora de voltar.
Conversamos sobre coisas guardadas, algumas para lembrar, outras para deixar bem no fundinho do armário, mas estavam todas lá. Marcas que ficam, profundas, rasas, felizes, doídas, cheias de esperança, em paz.
Engraçado achar que estamos meio perdidas, bagunçadas, arrumando as coisas pelo caminho. Engraçado é ver que ela tinha toda a razão quando dizia: “Deve ser assim mesmo”. Agora eu concordo. Será que estamos nos entendendo?
Ela sempre pareceu muito mais forte do que eu. Naquelas horas bem complicadas ela sempre aparece e é quem resolve tudo sozinha.
Entre tantas coisas contadas e revividas lá estava eu.
Agora parecia mais ela do que nunca.
E eu a recebo, aceito, acolho e carrego comigo pela vida.

domingo, dezembro 02, 2007

Aos Pedaços


Eu olhei ali, no fundinho dos seus olhos hoje. E talvez não haja nada mesmo por lá que me reflita, além da luz que impressionou tua retina.
Confesso que me senti um tanto triste, um tanto livre e um tanto... desprotegida? Não, não era essa a palavra...
É uma palavra que a gente usa quando está sem... casa?
(Sem... teto? Hahahahaha! Não, não era bem isso.)
Talvez mais tarde eu me lembre da palavra exata.
Senti também outra coisa...
Que conheço tão pouco de você...
Talvez eu conhecesse a parte que importa...
Mas, tantas outras coisas que eu não fazia idéia... e das quais eu poderia gostar bastante também. (Por que será que você não as mostrou para mim?)
Passei um tempo a me perguntar por que te gosto tanto, assim: um pedacinho.
Quem sabe tenha sido apenas uma daquelas ilusões que a gente inventa por pedacinhos lindos das pessoas.
Estava com saudades do seu sorriso... e você o economizou bastante desta vez...
Era muito bom ser motivo dele – vou sentir falta.
A palavra eu não lembro mesmo. Quem sabe uma outra hora.
Agora ela está sendo substituída por “vazia”.
Tem um vaziozinho estranho aqui comigo.
É diferente pensar que, apesar de tudo, nada vai mudar,
mas... tudo vai mudar...
Talvez tudo já tenha mudado...
Pela primeira vez senti que não tínhamos nada a nos dizer.
Não porque realmente não tivéssemos, mas porque... não quisemos - as frases andam curtas.
Tantas coisas para te perguntar ainda... e um medo de que você não queira responder mais nada.
Muitas coisas para te responder e... nenhuma pergunta.
Você é agora um outro inteiro. E eu tenho medo de não conseguir mais guardar aquele pedacinho...
Como mantê-lo intacto, se tudo ao redor muda?
A promessa dele aquietava algumas das minhas infinitas ansiedades.
Tenho medo de você não querer que eu o guarde (a verdade é que eu nunca soube se você queria).

A palavra é: desilusionada.
Eu sei que ela não existe. Assim como também não existiram todos os sonhos que acabei sonhando contigo aos pedacinhos...
Tive que inventá-la um pouco, para tentar me explicar.
Tive que inventá-los, também, para tentar me explicar a mim...
Quem sabe um dia eu os consiga explicar para você...

quarta-feira, novembro 21, 2007

!saravá!

...semana da consciência negra...


No começo parecia Exu,
Mas logo eu vi que não havia maldade...
Muitas vezes se mostrava como Ogum: o guerreiro de ferro.

Talvez fosse Oxossi, o Deus da caça.
Mas o quê caçava?

Como estava sempre com seus guerreiros,
pensei que fosse Obaluae.

Mas havia tanta doçura no olhar...

Talvez a violência fosse apenas a expressão da justiça.
Seria então filho de Xangô?

Ossaim, Oxumaré não poderiam ser...

A pele, o riso, a força,
Jovem e viril,
Amava o mar e as pessoas...

Em sua bondade infinita não poderia ser Orixá!

Mas quem se atreveria a perturbar as águas de Oxum?
Um guerreiro jovem talvez?
Logun-Edé quem sabe?

Ou seria penas... um Erê?

quarta-feira, novembro 14, 2007

28


Contagem regressiva é o caralho! A minha é progressiva: em segundos eu serei uma menininha de 28 anos nas costas, muito largas, sustentadas, diga-se de passagem, por um belo par de pernas.
28 e algumas constatações relevantes: A mesma poesia que choro, alegra minhas idas e vindas nesse tragicômico que chamamos de cotidiano.
Ela poderia ser mais bem escrita. Poderia ser mais lida. Poderia...
28 e... professora! Me pergunto do que se tratam essas aulas que teimo em continuar “ministrando”, quando não acredito que deva convencer alguém, mas, pelo contrário, que se convençam de que estou errada e que me ensinem as outras coisas que possam me ajudar a dar maior sentido à vida. Me ensinem mais graça...
28 e... hehehe... o que procuro é muito mais graça...
28 e, anteontem, ou sei lá quando, fui ao shopping com uma amiga para comprar sapatos. Aquele monte de gente se aglomerando ao redor das vitrines faz com que eu perca momentaneamente a capacidade de me encantar com o mundo. Nessas horas eu penso no que o meu amor por você significa e ele poderia ficar pequeno e feio.
Ele é uma tentativa de a gente se sentir especial no meio de tanta, tanta gente igual. É uma tentativa de se sentir diferente e único, mesmo que seja só para uma outra pessoa nesse mundo inteiro, mesmo que seja lá longe. Ele é necessário... e eu não amo as coisas necessárias.
Mas eu amo você.
E música.
28 e um doutorado nada a ver, num programa de pós-graduação nada a ver, com professores que pensam coisas que eu acho nada a ver, para me ajudar a alcançar o posto de... acadêmica!
Bah... nada a ver...
Nenhuma ciência me explica a vida melhor do que Drummond. E nenhuma explica o que sinto quando o Freddie Mercury desafina cantando Under Pressure como se não houvesse amanhã...
28 anos e 14 com você. Metade da minha vida com você, companheiro! Acho que estou enjoando do seu cheiro... não rola mais um clima, sabe?
28 e a gente não chega junto aos 29. É uma promessa. Para mim.
28 e... por falar nisso, as paixonites continuam infantis: 23, 22, 21 anos. Ainda cedendo a poesias e musiquinhas cuspidas, em troca de um convite para o meu corpo. Quando eu gostaria que visitassem, muito, mas muito mais, tudo que eu amo no mundo... e que amassem. Junto.
Talvez eu devesse deixar isso mais claro... 28 e não consigo deixar nada muito claro...
28 e meus sonhos de infância me assombram todos os dias: o que não vivi, o que não amei, o que não sofri... desejo tudo aqui e agora. Quando eu era criança sabia o que precisava para ser feliz. E dizem que a gente amadurece quando cresce...
28 e estou ingressando num novo esporte: corrida com barreiras. Hein? Você não sabia que isso existia? É, nem eu... mas, parece divertido ver os tombos dos outros...
28 e meu plano para o futuro é virar cantora de rock ‘n roll, escritora de crônicas sarcásticas e cozinheira. Morar numa casa cheia de gatos, com uma árvore muito alta, de onde penda um galho onde eu possa pendurar um balanço de madeira. Para ir e vir todos os dias, junto com as minhas epifanias!
28 e acho que vou montar minha primeira banda! Finalmente!
28 e nada definido: nem carreira, nem família, nem, sei lá mais o quê que se define ao chegar nessa idade. Eu defino, no máximo, o bar onde vou surtar no próximo sábado... quem sabe uma sinuca na quinta...
28 e olho as roupas que umas amigas usam para ir ao trabalho e reconheço a minha mãe, quando eu era pequena e ela ia ao trabalho. Fala sério! Ninguém merece usar roupas dos anos 80! Só faltam as ombreiras! Se, para eu ter uma carreira estável, tiver que me vestir assim, tou fudida...
Mas, pensando melhor... 28 e acho que eu não quero uma carreira estável...
28 e uma saudade do mar que me aperta de tanta secura! 28 e esse arrependimento doído: saudades, saudades, desse outro mundo que deixei na ilha... onde eu estava com a cabeça aos 26, quando decidi vir pra cá?

28 e andam me dizendo que eu deveria cortar as mini-saias. E eu me pergunto se não vou ser presa por sair na rua com a bunda de fora. Cortar mais???? Tsc, tsc! 28 e o mundo está ficando moderno demais pra mim...

terça-feira, novembro 13, 2007



Todas as vidas perdidas. Por todos os lados, nas minhas oito dimensões só o letreiro brilha na tela: game over. Nem mesmo os bônus e as magias puderam me reconduzir ao jogo. Talvez as armas especiais pudessem. Mas sempre preferi as magias... Devia ter lido as instruções como sempre faço. Nos outros é tão fácil.

Mas eu estava quase lá. Conhecia todas as etapas só não contava com o acaso, que levou o dia, o amor e o humor. Agora perece que o medo é melhor que a derrota. Ainda mais quando a luta é virtual e os inimigos apenas em parte conhecidos.

Distraí-me com os cenários e os efeitos. Incomodei-me com alguns sons e muitas vezes, fui pelo caminho mais longo. Perdi muito tempo. Fiz manobras que não queria e deixem que jogassem o meu jogo. Esqueci a guerra.

Testei todos os sentimentos humanos diante da máquina e nada adiantou. Linguagens incompatíveis. Jurava que podia algum dia transpô-la. Mas fui derrotada. Todo esforço sem sentido...

Em apenas uma frase, em negrito vermelho: fim do jogo pra você.

That’s it
There's no way
It's over, good luck…

domingo, novembro 04, 2007

mmmmm...


Se numa dessas noites de solidão você me encontra,
nua, debaixo de algum tapete da sua casa vazia...
me afaga numa rede em fins de terça...
Me remói, me percorre, me demarca.

Ai se você me descobre...
e arranca essa minha máscara de baile,
me atormenta e me mastiga os sonhos.
Anda garoto, me aborreça...

Me coloca no seu lugar,
e sobe no meu pedestal.
Usa a sua língua de mordaça...
para que nada do que eu diga faça qualquer diferença.

Diálogo com a saudade...




Aproveitando o ensejo...

- Estou te deixando...
- Estou bem.
- Eu sei.
- Um pouco triste talvez.
- Passamos bons momentos juntas....
- É verdade.
- Lembra ainda pequena, quando choravas ao ver as fotos?
- Eu dizia que era você!
- E era! Eu já te gostava...
- E por quê?
- Especialmente por sua memória... Consegues apreender cada detalhe, descrevê-los e revivê-los como ninguém.
- Então porque me deixas.
- Por você. Não percebes como sofres? Minha culpa...
- Não entendo?
- Meu substituto já chegou.
- E quem é?
- O desapego.
- Já tentamos uma vez... Não sei se consigo? Amo demasiadamente. Sinto que teremos conflitos...
- Por isso precisas dele. Serás mais forte.
- Tenho medo de perder a sensibilidade.
- E perderás. Mas nunca acabará. Porque é sua.
- E você e eu? E nossa... como posso definir? Relação?
- Definir pra quê?
- Mania...
- Apenas guarde. Pense com alegria, mas não deseje.
- Outra vez o desejo...
- Enquanto evocas a mim e ao desejo, juntos, não terás paz.
- E o que devo fazer?
- Deixar ir... Eu e todos os outros...
- Mas e eu?
- Ele está a tua espera.
- Ainda tenho medo.
- Não temas, apenas aceite-o.

sábado, novembro 03, 2007

Good Company


Às vezes, e só às vezes, a gente conhece umas pessoas deliciosas, de quem a gente fica meio viciado em... ficar perto!
Não, eu não estou falando de bons amigos. Mas também não estou falando de alguém cujas nossas únicas intenções são ficar, namorar, trepar e afins.
É todo um meio termo indefinido que não pode ser só amizade – porque você quer algo mais, mesmo que seja ficar abraçado, de mãos dadas, fazer cafunés (às vezes, até beijar muito e todo o resto) – e não pode ser só ficar – porque você também quer falar muuuuita bobagem, dar risada, passear, ficar sem fazer nada, na companhia estranha daquele ser.
Na minha cabeça, essas pessoas podem gerar muita confusão.
Não que eu não goste, mas a gente é meio acostumado, “socialmente”, a um monte de regrinhas estranhas que vão por água abaixo nessas situações.
Se você liga pra um cara, se você sai muito com ele, às vezes se você o conhece há pouco tempo, o mais comum é esse cara achar que você está a fim dele.
E você até está! Mas é num outro nível...
Você olha pra cara dele e tem vontade de passar a mão em seu rosto. Você ouve uma música no bar e tem vontade de ligar pra ele às 3 da manhã! Pra contar pra ele que você ouviu! Porque você sabe que ele é uma das únicas pessoas no mundo que vão entender a sua felicidade por ter ouvido aquele som brega! Você pensa nele várias vezes por dia. E muitas outras por noite. Vocês saem pra tomar cerveja e falar muita bosta numa balada ótima! E isso é tão bom quanto ficar em casa ouvindo música no micro...
Alguém entende? Eu não.
Dá muito medo de... espantar essa pessoa pra longe! Sem querer! Quando o que você quer mesmo é... grudar nela...
Daí a gente tenta dar uma disfarçada nessa vontade imensa e acaba “inventando motivos” para se encontrar. E os motivos podem ser os mais engraçados...
- Oi tudo bem?
- Tudo!
- Vamos tomar cerveja?
- Agora?
- É!
- Mas são oito e meia da manhã!
- Você é um florzinha mesmo, né?
- A hora certa para começar a beber!! uhuuuu! Vamos!

Outros possíveis...
- Vamos à festa do peão boiadeiro? Pode ser divertido!
- Vamos jogar sinuca?
- Quero revanche na sinuca!
- Hoje eu quero revanche na sinuca.
- Hoje EU quero revanche na sinuca. (revanche na sinuca pode ser uma desculpa eterna. É só saber usá-la).
- Fiz um almoço mexicano, tem coragem de provar?
- Eu posso ler I Ching pra você! Agora!
- Vamos à praia? Eu ouvi falar que vai ter uma tempestade de raios a qualquer momento!
- Quer ir ver uma árvore bem bonita? fica a uns 3 quilômetros daqui... no alto de um morro. Mas tem que ir a pé, porque não tem estrada...
- Vamos andar a toa?
- Quer vir aqui em casa comer um ovo? Cru? É que meu fogão tá sem gás...

E a melhor, mais gostosa e mais eficiente de todas as razões:
- TENHO QUE TE MOSTRAR UMA MÚSICAS!!!
Em casa, no carro, numa banda que toca no bar, assobiando, batucando na caixa de fósforos, em qualquer lugar...

E, apesar de os motivos serem, normalmente, bem legais e divertidos... o que dá vontade mesmo é curtir aquela boa companhia o tempo todo... sem motivo algum.
Mentira! Na real, música é sempre um ótimo motivo...
Bah... estou com saudades...

terça-feira, outubro 30, 2007

Diálogo com a ilusão


- Tem que estar por aqui, eu sei que está...
- Me procurando?
- Ah sim, eu sabia. Por que não me deixas?
- Porque não posso.
- Não quero mais sofrer.
- Então deves abandonar o desejo.
- O desejo?
- É. Nunca reparaste em nossas semelhanças?
- Hmmm... Talvez...
- Somos irmãos.
- Sempre achei que fosses irmã da dor.
- Também. Somos três: o desejo, a ilusão e a dor.
- Sempre via as duas juntas, mas o desejo?
- É, todos demoram a perceber.
- E porque causam tanto sofrimento?
- Porque vocês querem sempre mais.
- E não pode?
- Não deveriam...
- Como é possível viver sem o desejo?
- Eu não sei... Eu mesma não consigo!
- Não seja irônica.
- Somos todos filhos do sonho e da fantasia...
- Então?! É tão bom estar com eles...
- Bom?
- Tudo bem, não tão bom quanto à realidade.
- Eu sei.
- Mas quando a realidade não pode estar eles sempre estão...
- É isso!
- Como?
- São sempre a segunda opção. Se não podem ter as coisas ou as pessoas, vocês os têm...
- Verdade.
- E ainda os queria felizes?
- Sim. Não. Eu não sei... Parece que de alguma forma sempre os preferi...
- Por isso sofres. Eles não existem.
- E se não quero?
- Desista.
- De quê?
- Melhor perguntar de quem?
- De quem?
- Da paixão.
- Sem paixão, sem sonho, sem fantasia, sem desejo, sem ilusão, sem dor... sem vida...

De repente Rio...




Meio assim de última hora, mas nos planos da agenda, aconteceu. Foi estranhamente calmo. Como uma paixão meio planejada teve pouco mistério. As vistas eram parcialmente conhecidas. Por imagens e imaginação eu sabia como era... Mas o cheiro ainda era um mistério.

A chuva fria que caia durante o primeiro encontro tornou o momento verdadeiro. Nenhuma pose valeria à pena. Era um dia normal sem a excitação de cartão postal. Mas também não precisava. Nunca tinha desejado estar no Rio. Estava lá porque bons ventos apontavam novas possibilidades...

Olhava atenta. Cada detalhe era especial porque era novo e velho ao mesmo tempo. Era como entrar na televisão em uma história programada. E justamente essa previsibilidade de comportamento limitava meus movimentos. De repente era eu mesma. Eu no Rio! Ironicamente desarmada.

Pelo caminho, a realidade se apresentava aos olhos em constantes contrastes que se contrapunham o tempo todo! Ora tão belo, ora tão ruim que a consciência sussurrava certa culpa. Tudo, muito, cheio, nada, pouco, vazio... Natureza, homem, máquina cravados em rocha. Por que só agora me permiti?

Surpreendi-me apenas com a resistência aflorada numa aparente calma diante da Babilônia. Aos poucos fui acostumando ao seu jeito estranho: um misto de graça e mal humor. Era um Rio diferente, entre Marina e Dicró. As coisas não precisam de vocêêêê... quem disse que eu, tinha que precisaaar... Mas agora precisava. Queria. Estava lá: eu e o Rio.

Agora descubra de verdade o que você amaaa... (...) o mundo pode ser seu!!!
Na despedida, cheia de suspiros disse baixinho: “eu volto!”.

segunda-feira, outubro 29, 2007

Um Sinal!!!


Agora chega de poesias fofinhas e sérias. Quero é chutar o balde mesmo.
Esse estado de suspense, de incógnita, de não sei bem o que vai dar, já está me irritando demais. E olha que eu sou bastante paciente. Cansei! Quero enfiar o pé na jaca!
Acho que já dei trégua o suficiente para o meu coração. Está na hora de sofrer de novo, de doer de novo, de ficar deprimida e chorar junto com as novelas.
Toda essa postura compreensiva anda me estressando mais do que as tristezas das paixões mal-resolvidas (ou bem resolvidas, mas que doem do mesmo jeito).
O negócio é o seguinte: quer ficar comigo? Fala logo que quer! Faça alguma coisa pra eu saber que você quer! Não quer? Fala logo também!
Esse papo de “é tudo muito complicado, porque a vida não é assim, porque há coisas a serem consideradas, porque vamos ver”, porque blá blá blá, já me cansou!
A falta de papo também me irrita. A gente se cala pra não ter, exatamente, que dizer o que sente, o que quer, o que pensa.
Eu quero te beijar pô! Ainda não deu pra perceber? E você?
Me colocam assim, num estado de suspensão, em que eu não posso nem me lançar em novas conquistas, em novas pessoas, em novas paixões, mas que também, não me dão nenhum sinal de que alguma coisa vai sair dessa historinha.
E eu no meio, feito um joão-bobo que não sabe se corre pra um lado ou para outro, enquanto jogam o meu coração pra lá e pra cá.
E a minha vontade era a de me jogar de cabeça, seja lá para qual lado. De repente, curtir sem rodeios essa promessa de paixão. Apertar a tecla “foda-se” mesmo e ver no que dá. Mas viver mesmo, sem medo, sem dó. Sem pensar nas conseqüências. Elas são para depois.
Depois eu fico triste, depois eu vou me recuperar, depois eu vejo no que dá. Porque, na verdade, pior do que a possibilidade de um depois estragado é esse meio sem fim. Um meio que não se desenvolve, um monte de ansiedades, de medos, de sonhos que simplesmente não vêm!
É claro que esse meio existe sempre e é até gostoso. Uns frios na barriga, uns encontros estranhos, daqueles que a gente não sabe o que dizer. Uns olhares pra baixo, umas vontades de beijos que acontecem num dia, mas não em outro. Mas, a vontade é de acelerar todo esse processo, como se as horas passassem e a gente só percebesse minutos.
Mas, às vezes, esse meio se prolonga por tanto tempo, que todo esse joguinho acaba perdendo a graça. E eu curto a minha vida com mais sal...
E o mais bobo de tudo é que... é tão difícil encontrar alguém com quem role uma sintonia... que, quando eu encontro, acho um desperdício deixar tudo isso passar por medo... por pensar demais...

Queria só um sinal... vermelho ou verde. Esquerda ou direita. Só não quero mais ficar parada, pensando no que poderia fazer.

terça-feira, outubro 23, 2007

...estórias para acordar...



Queria ser um palhaço diante de você criança. E te arrancar francas gargalhadas! Melhor ainda, queria ser um mágico! E provocar surpresas e olhares curiosos diante de simples movimentos.

Se deixasse, te levaria pra Terra do nunca. Despir-te-ia de toda responsabilidade do mundo das coisas daqui... Deixar-te-ia pilotar o corpo entre nuvens de fantasia. E apenas um rumo seria certo: a liberdade.

Com a leveza de uma fada travessa, guiar-te-ia pelos sete mares, sobrevoando e espalhando o pó de fadas a todos os ventos, misturados com meus desejos de você!

Depois, brincaríamos como dois duendes, alegres guardiões do pote de ouro no fim do arco-íris. E com as sete cores, pintaria os teus dias, todos os teus dias! E as noites seriam mil e uma e duas e três... sobre um tapete voador...

Se isso fosse ainda pouco, levar-te-ia ao país das maravilhas! Cortaríamos cabeças! E com elas nossos medos e memórias do mundo daqui.

E quando cansássemos poderíamos deleitar um sono leve, escondidos na cidade das esmeraldas, Oz. Somente eu e você, triunfantes diante do mal - do mundo dos homens.

Se quiseres é só seguir até a segunda estrela à direita e então direto, até amanhecer. E eu estarei lá, a tua espera.

segunda-feira, outubro 22, 2007



Para além da memória,
Para além dos sentidos,
Entre verdes e dourados...

O grito da torcida e o barulho dos carros apertam meu coração.
É a saudade da tua presença.

A presença alegre e viva dos teus olhos me desejando,
Das tuas mãos me tocando,
E das duas bocas compartilhando saberes entre sabores!

Se eu pudesse com meus pensamentos
Materializá-lo como em sonhos,
Desejaria tê-lo uma vez mais...

E seria assim:
Envolvente como um perfume,
Embriagante como uma cerveja,
Doce como um chocolate
E relaxante como um cigarro!

quinta-feira, outubro 18, 2007

Su(b)tilidade


Existe uma certa sutileza em se deixar a vida...

Havia, numa caverna, adormecido, um grande leão dourado. Nunca se soube, na verdade, há quanto tempo ele jazia naquele escuro, como se nem mesmo estivesse lá, alheio a todas as situações mundanas que o rodeavam.
O leão escolhia dormir, enquanto, ao redor, toda a terra se movia.
No dia em que um grande furacão atravessou a mata, as mães, desesperadas, rogavam ao leão que se movesse, ajudando-as a segurar seus filhotes que, de tão leves, eram jogados a todos os cantos pela ventania.
O grande rei abriu suas pálpebras pesadas, ensaiou um rugido – que mais pareceu um ronco – e virou-se para o outro lado, deixando os filhotes à sua própria sorte. “Essa é a lei da natureza. A lei do mais forte. Apenas eles deverão sobreviver”.
Depois do vendaval, ali não se ouviu mais falar em crianças. O vento as havia varrido e a dor de sua ausência era tão grande que ninguém mais poderia se lembrar.
O medo de sofrer novamente tamanha dor fez com os habitantes nem mesmo considerassem a possibilidade de povoar esta infância novamente, fazendo, do lugar, um recinto da juventude até a velhice.
Os jovens, sempre muito livres, corriam por toda a terra, espalhando sua ingênua rebeldia, como vôos de borboletas que acabaram de sair do casulo. Seus corpos vigorosos proviam-nos de energia tamanha, que os tornava capaz de qualquer realização.
Nesta mesma época, um grande lobo chegou ao reino, difundindo as idéias que havia aprendido em suas andanças pelo mundo. Sua postura forte, suas palavras firmes, seu andar pomposo, todo ele, lembrava aos jovens uma figura que há muito haviam esquecido.
Os mais adultos estavam muito ocupados em busca de provisões para dar ouvidos ao lobo. E os velhos consideravam-no apenas mais um falastrão, a quem não valia a pena dedicar sua preciosa sabedoria ou atenção. Mas os jovens... eles o seguiam em todas as caminhadas e obedeciam cegamente a seus ensinamentos, encantados que estavam com sua dedicação.
Foi por essa época que alguns jovens começaram a desaparecer. Primeiramente, deixava-se de ouvir no reino os bés de uma ovelha negra que falava pelos cotovelos. Após uma semana, não se ouviu mais os gritos de um macaco-prego. Após uma outra semana, foi a vez das duas lebres gêmeas. E assim, a cada semana, um dos adolescentes parecia ter sido banido da face da Terra.
Suas mães, já anestesiadas pela dor da perda dos filhotes, nem mesmo tentaram acordar o leão dourado dessa vez. Fizeram alguns esforços de busca, mas, tudo que encontraram foram carcaças. Alguém andava comendo seus jovens filhos...
Até que uma noite, uma coruja decidiu deixar de lado sua caçada noturna e espreitar a reunião do grande lobo na floresta. Ao fim dela, continuou seguindo o lobo, enquanto ele adentrava a mata em companhia de um jovem cervo.
Em um dado momento, o lobo parou frente ao lago, encarou o cervo nos olhos e saltou sobre ele, cravando os dentes em seu pescoço. Nada foi ouvido, nem mesmo um sussurro.
A coruja voou de volta ao reino, desesperada em espalhar a notícia. Mas... quem poderia enfrentar um lobo daquele tamanho?
Fez uma curva, tateando o vento com a ponta das asas e dirigiu-se à caverna do leão dourado. Tentou acordá-lo, gritando seus pios e agitando seu corpo no ar. O leão abriu uma pálpebra e fechou-a novamente. Estava muito cansado e não via motivos para se alarmar. Apenas um velho lobo, comendo alguns jovens fracos e desavisados. É a lei da natureza, não é mesmo?
A coruja, desesperada, avisou a todas as criaturas do reino que era o lobo quem estava devorando os habitantes. Mas ninguém parecia saber o que fazer, além de tentar prender seus filhos em casa e alertá-los sobre a ameaça.
Na semana seguinte, uma jovem leoa bebia água sozinha às margens do rio, quando o lobo sussurrou algumas palavras às suas costas. Apavorada, ela se virou para trás, mas não conseguia reagir. Estava paralisada de medo. Quando o lobo deu um primeiro passo à frente, do fundo do corpo dela veio crescente um som estridente e baixo, que saiu de sua boca na forma de um longo e alto miado.
O leão dourado acordou.
Seu rugido estremeceu a terra inteira. Saiu da sua caverna escura num pulo e correu até o rio, sem perceber sua velocidade, seu caminho, sua fúria. Nada sabia do que o havia feito acordar. Nada daquela vontade imensa de destroçar qualquer que fosse a coisa que ameaçava o ser que lançara para o alto o grito de desespero.
Quando chegou, olhou o grande lobo nos olhos e notou o sangue que escorria da sua boca. Atrás dele, a leoa respirava com dificuldade, deitada numa poça da água vermelha que saía da sua própria garganta.
O lobo sorria em tom de desafio perante toda aquela majestade da qual só ouvira falar. Achou-o menor do que contavam, mais cansado do que contavam, menos imponente do que contavam. Achou-o um fraco.
Era bem verdade que tanto tempo hibernando havia definhado-lhe os músculos e tornado-o mais lento. Apesar disso, o leão não entendia a imensa dor que sentia ao observar a presa do lobo. O imenso ódio que crescia no peito. E a tamanha força que esse ódio lhe dava.
Lançou-se para o lobo a patadas, arrebatando-o muito rapidamente. Cravou suas unhas e presas por todo seu corpo. E, quando percebeu que o lobo já estava morto, não parou de deferir golpes. Queria matá-lo de novo. E de novo. E de novo. Até que daquele corpo, nada mais restasse. Nem mesmo uma lembrança.
Ouviu uma voz às suas costas que dizia “ele já está morto, você pode parar agora”.
Quando se virou, percebeu que todo o reino o observava com curiosidade e admiração. E pena.
O velho leão deu mais um olhar para a filha morta.
Tomou o caminho de volta à caverna, mas, lá, não entrou. Prostrou-se diante dela, como uma esfinge que guarda um portal.
E nunca, nunca mais dormiu.
Mari Brasil

terça-feira, outubro 16, 2007

Diálogo com a solidão

De repente chegou a solidão.

-Você por aqui?
- É, voltei!
- Mas eu não chamei...
- Estava ali de olho e percebi que estavas sozinha...
- Sozinha? Impressão sua. Estou com minhas lembranças.
- Onde?
- Dentro do peito.
- Lembranças de quê?
- Deveria perguntar de quem?
- De quem? Não me diga que é...
- Do amor? Não, não...
- Então de quem?
- Adivinha.
- Do desejo?
- Não.
- Então só pode ser do carinho.
- Errou de novo.
- Ta me irritando...
- Que bom!
- Não me queres aqui?
- Nunca quis...
- Mas te acompanhei tantas vezes...
- Eu nunca quis falar, mas nunca gostei da sua companhia.
- Por quê?
- Porque me consomes...
- Parecias gostar...
- Eu fingia.
- E por que fingia?
- Por que tinha medo.
- Ah eu sabia... Sempre ele. E agora?
- Mandei-o embora. De vez.
- É mesmo? E por quê?
- Pra me afastar de você.
- Sério?
- Aham.
- Quer dizer que a gente...
- É. Acabou...
- Logo agora que eu estava acostumando...
- Eu também estava.
- Então quer dizer que de repente... mais tarde, a gente pode...
- Não, não pode. Não quero.
- Por que não?
- Porque prefiro ela...
- Ela quem?
- A saudade.

quinta-feira, outubro 04, 2007

Nômade


A casa não está erguida.
Ela não é seus tijolos: são janelas e frestas que se abrem nas paredes, permitindo a certos estranhos a entrada.
É a caixa de correio e sua estrutura, própria, mas pertencente ao lugar de onde se sonha.
São Marias e Anas observando o projeto, o grande projeto. Planejando-o, através do baralho cigano: um castelo de cartas.
Correntezas de vento desfazendo muralhas vermelhas cobertas de rosas vermelhas. São novas torres de mármore subindo, atrapalhando a vista das paisagens campestres, onde pastam os pulgões e gafanhotos.
São sons de boa noite no rastejar pela grama que, de início, assustam, mas, depois... embalam sono tranqüilo.
Sonhos com o passado indicam como agir no presente, enquanto se presta mais atenção ao futuro: na casa, cai uma telha, abre-se uma goteira. Aqui, agora...
Agora, atentar à respiração: a casa pulsa: suas costas inflam e sopram rumores do porvir. E assim, cerra-se os olhos e aproveita-se as madrugadas.
Sentir o fogão aquecer o ventre, para que pára a nova idéia.
As árvores que visitam o telhado ainda espantam. Suas folhas forram o quintal: um tapete de boas vindas.
A escuridão do quarto mais meu atrapalha alguns cheiros. Suas grades prendem, mas protegem...
Encha-se o quarto de abajures, alumiando a vida de dentro!
O cão que habita a casa anda apoiado apenas nas patas de trás. Caminha como gente, pensa como gente. É cruel como gente: nutre-se de atacar os filhotes de gatos desavisados.
Há que se ter quem olhe os pequenos.
Lá no alto, no muro, duas lanternas acesas: um grande gato preto a tudo observa, guardião do portal. Nada o afeta em suas andanças de um lado a outro do muro longilíneo. Tantas dores sofridas o fizeram bruto e desconfiado. Palavras e toques não o comovem.
As árvores que espalham seus frutos e flores e aromas tornam sua alma mais bela. Dentro de uma delas vive preso um espírito de mulher, que procria seus frutos, mas não se liberta. É um útero imóvel, que não embala bebês.
O espírito não acredita poder existir além da dádiva das raízes. Não acredita nadar, guiar suas ações.
Acredita ser. À mercê.
Apesar de tantas prateleiras, a desordem parece reinar. São os esforços diários para manter tudo no lugar que são falhos, pontuais, são catarses.
A limpeza é toda uma revolução que ocorre de tempos em tempos.
Falta piso no chão. Piso, direto na terra.
Falta uma cortina no box do banheiro, então a água espalha. Falta água no ar, mas não aqui, dentro.
Não há horários que não se possa desobedecer. As horas dos relógios andam diferentes, para mais além: muitos tempos se acabam perdidos.
As tomadas alimentam as músicas que alimentam a esperança da casa a terminar.
Muitos mistérios habitam suas madrugadas, que provocam o medo e dão graça às suas cores. As corujas voam à noite e inspiram romances e contos de horror.

Mas, não há gavetas suficientes e nem coisas suficientes para preenchê-las: tudo na casa... transborda.
Mari Brasil

sábado, setembro 29, 2007

Bom mesmo...

É saber que você está aí
Sem que eu precise me preocupar.

É te amar assim, de longe,
Te idealizar.

É não ter que lidar com as coisinhas pequenas
E belas.

É não ter que te ouvir reclamando,
Saber que você sempre será perfeito, assim:
De longe...

Pensar em você o dia todo,
Uma imagem distante, um sonho constante.
Aqui, no meu peito.

Bom mesmo é que esse você me acalma demais,
Não me tortura, não me consome.
Você some.

É tratar os teus gestos na minha memória,
Re-inventar suas mãos,
Sentir falta do que não existe além da minha convicção.

Bom mesmo é lembrar teu sorriso,
Um gesto preciso,
De apaixonar.

Tocar o teu beijo,
Como se o desejo,
Explodisse no ar.

Mas, apenas em sonho acordado,
Te sinto ao meu lado,
E acredito...
te amar...

quinta-feira, setembro 27, 2007

Um gosto de amar

Transbordava um amor sem fim, mas,
sem rosto, sem corpo, sem gosto:
Não, definitivamente, não era incapacidade de amar...

Era um amor pela própria paixão!
Pela cegueira inebriante do romance,
pelo exercício poético de o inventar

Sendo assim, ao vislumbrá-la, menina, tornou-a sua musa:
declamou-a em todos os seus contornos.
Recriou-a, enfim: seu próprio ar

E respirou-a em manhãs geladas,
devorou-a em noites ardentes,
deu-lhe asas, para que pudesse voar

Por medo, deu-lhe também uma gaiola dourada,
construída de letras e toques,
como ninguém antes havia conseguido lhe dar

Ela recebia cada vez mais palavras, que ainda mais a cercavam,
que ainda mais a amavam e a confortavam
e que permitiram que ela também, pudesse por ele se apaixonar.

Mas, dentro da gaiola, ele examinou-a com lupas,
procurando os detalhes ainda a descrever.
E, olhando tão de perto... perdeu-a!

Perdeu a paixão de vista, de tanto compreendê-la
de tanto entendê-la, sua musa esgotada,
a quem já não podia admirar...

No estranhamento do adeus,
a paixão repousava num muro, indo embora,
o amor movia-se... para algum outro lugar...

Parece que agora,
anda às cegas, escrevendo poesias
ainda, a buscar...

Um outro corpo, um rosto para o seu amor
um gosto:
Um outro gosto de amar.

terça-feira, setembro 25, 2007

Momento

Felicidade: palavra estranha de largos passos. Alguns sempre à frente, mas, em sua maioria,
sempre para trás.
Sonha-se, à frente, a felicidade: na barriga que cresce sorrindo o porvir;
na fantasia do beijo que ainda não aconteceu;
na linha de chegada, quilômetros à frente...
Lembra-se para trás: aquela primeira viagem, muito mais para dentro de si, do que para fora do estado;
um “eu te amo”, baixinho no ouvido, sob imenso céu azul;
quatro horas de cervejas e discussões e besteiras no bar da esquina;
uma bicicleta nova trazida pelo velho Noel...
A cada música tocada, um pedacinho dos passos é reconhecido pelos pés. Fecha-se os olhos como se este movimento nos levasse de volta para lá: lá do passado e lá do futuro:
um gosto de jabuticabas estourando no céu da boca; um cheiro de quarto de avó; um castanho-esverdeado dos olhos...
Mas,
Quantas vezes se sente, sem passos à frente ou, cem passos atrás? Parado, ali, o gosto da jabuticaba?
Quando, estático? Como se flutuasse rasante o olhar naquele minuto?
Uma vez:
O tempo suspenso, enquanto, do teto do céu, via-se as quatro amigas no carro, descendo o morro cantando e dançando aquele minuto estacionado entre os universos.
Uma vez:
No ir e vir da rede, uma hora fria em que se confessa, embriagado, a paixão...
Uma vez:
Uma tarde jogada debaixo de cobertores, embalada por um silêncio sincero entre amigas.
Uma vez:
A música de que não se lembra tocando brincalhona numa rádio de cidade do interior.
Uma vez, uma lagoa tocando seus pés num dia quente de verão.
Uma vez a emoção de voltar a enxergar sem nenhuma lente. A saudade de casa. O nhoque da outra avó. O sorriso do pai. O passeio com cachorra!
Uma vez...
E... quando de novo?
Me coloco a imaginar uma nova cena. E os passos, novamente, adiante!
A felicidade, tomando o caminho da ansiedade, estranha a passos largos. Quando, de novo?
A felicidade, de novo, saudade do que foi e do que está para nascer.
Uma vez...
mais.
Mari Brasil

terça-feira, setembro 18, 2007

Eu sei..

As conexões estabelecidas naquele sol nascente,
Ainda me prendem a você...

Eu sinto; eu sei.

E não precisas de palavras,
Apenas teus gestos, ainda que virtuais, me dizem:
Não há amigos ou festa,
Não há trabalho nem sesta,
Deleita-se agora nos braços de outra mulher.

Acalma-me saber que a vida tem dessas coisas...
Eu mesma procurei refúgio,
Em vão...

Pois não cheirava como você,
Não beijava como você,
Porque não era você...

Assim anseio tua noite:
Desejo que procures e não encontres
Meus beijos em outras bocas.

sexta-feira, setembro 14, 2007

Uma noite com um garoto de programa

A festa não estava muito boa. Mas de repente um moreno não muito alto me chamou a atenção. Pele clara, cabelos e barba escuros, bem desenhados. Logo reparei nos brincos. Dois na orelha esquerda. Imaginei um terceiro em vários lugares, mas ficaria bom mesmo na outra orelha. Ele estava impecável. Elegante e discreto, mas sensual! De longe chegava a ter uma cara de mal. De perto logo vi que era charme. Fomos apresentados. Fiquei meio sem jeito e ele foi gentil. Conversamos longos minutos parados em pé. Depois sentamos um pouco. Logo me disse que era garoto de programa. Nas horas vagas trabalhava com informática, mas naquela noite estava de folga.

Os olhares curiosos não sei bem se buscavam ao meu lado uma outra companhia ou se se admiravam com a elegância do moço. Não me sentia exatamente desconfortável com aquilo. Mas também não tinha expectativas, afinal um garoto de programa poderia dar trabalho. Ele sugeriu caminhar. Queria entre outras coisas, aproveitar a cidade já que a noite estava quente. E eu parecia uma companhia interessante. Aceitei. Para minha surpresa conversamos por horas. Estava ficando cada vez mais interessada.

Ele me provocava sem perceber. Não conseguia entender se era o rosto bonito, o papo gostoso, o cheiro bom, ou a apenas a minha carência. Ele continuava fazendo charme. Eu não lembro direito o que falava, mas lembro como seus lábios se mexiam, excessivamente provocantes... Eu já não tinha certeza das minhas intenções...

Mas um garoto de programa? Tão seguro e tão sexy, tinha medo de não dar conta. E se ele estava de folga, seria bem mais caro também! Definitivamente minhas chances pareciam mínimas.

Ele continuava a falar, a sorrir, fazer charme e contar histórias... Adoro ouvir histórias! Mas não conseguia controlar meus pensamentos, estava apenas desejando. Queria ser o cigarro que ele acendeu naquela hora, pegou com delicadeza, mas puxou forte. Queria estar naquela tragada e ser a fumaça entrando no seu corpo...

E as mãos? Que mãos! Geralmente os homens não cuidam das mãos, mas ele... Estava até usando anéis, três. Um deles no dedão da mão esquerda absurdamente sexy. De fato era um garoto de programa.

Quando o cigarro acabou a conversa cessou, ficou um silêncio confortável. Olhei nos olhos dele como se pedisse algo e numa sintonia desmedida ele me beijou. Garotos de programa beijam nas horas de folga! Segurou meu pescoço e me beijou forte. Sabia como dar os comandos. Eu sabia que ele entendia do código de máquina, mas naquele momento parecia decifrar o meu... Executava com desenvoltura uma seqüência de instruções dadas em silêncio. Podia escutar apenas os meus gemidos.

Criamos uma lógica binária própria naquele instante. Era 1 e 1. Aceso e mais aceso! Eu deixei. Estava atenta a outra linguagem. Respiração ofegante, taquicardia, vaso constrição, sudorese. Tudo indicava um bombardeio de dopamina e noraepinefrina, em suas fendas sinápticas. O sistema límbico, processador natural, estava altamente ativado. Mas a unidade de controle seguindo a lógica da vida e não das máquinas, parceria deveras confusa. Onde estava a mão? A língua? A minha nuca na sua boca.... Diante de tantos estímulos e diferentes comandos ele me desconfigurou... Eu deixei. Já era de manhã e com a sutileza dos homens e não das máquinas vimos o sol nascer, com algumas promessas não sei bem de que...

terça-feira, setembro 11, 2007

Me fugiu



Me fugiu a cachorra hoje de manhã. Com ela, toda a minha paciência, minha facilidade, meu bom-humor. Era isso: a cachorra brincando comigo na rua era o destino me sorrindo orgulhoso, me avisando “cuidado, não se permita larga extensão do sorriso”...
A cachorra pulava de um lado para o outro, corria no meio da rua, bem na hora em que eu saía, já atrasada, morrendo de sono, para a aula. E eu sentia alguém bem longe rindo às minhas costas, zombando das minhas tentativas vãs de segurar a bichinha... me escapando pelos dedos, sem que pudesse fazer nada.
Uma coisa tão boba... e eu chorei! Como uma criança! Como viver assim? Rodeada de uma sensação de impotência que penetra os ossos? Ainda sou essa criança? Quando foi que eu esqueci de crescer, onde foi que não aprendi essa parte?
E depois de conseguir ajuda e de prender a cachorra, esse sentimento tomou conta de todo o dia: foi um guarda-roupa que o cara não veio montar, foi um trabalho que eu estou com medo de não conseguir fazer, foi encontrar aquele homem no meu café e não saber o que dizer, como agir. Ele também, me escapando por entre os dedos...
Cheguei em casa e sonhei que minha mãe me levava para cortar os cabelos. Estou me sentindo feia e vazia. E constantemente agoniada com essa sensação de impotência. Cortar os cabelos significa que está na hora de mudar. E as mudanças me apavoram demais.
O choro por não conseguir dominar aquele animal talvez fosse outro: não chorei ainda a sua perda. Mesmo porquê, como a cachorra, ainda imaginava que ele me escapava pelos dedos e não, que já havia escapado.
Sonhei, anteontem que o encontrava. E que ele me olhava fundo e perguntava se eu finalmente havia ido lhe pedir perdão.
Pedir perdão? E eu ainda tenho culpa? Não sei do que sinto essa culpa! Mas ela vive aqui dentro e me trava todas as vezes que o vejo. Por que? De que?
É como se eu chamasse a cachorra e, quando ela chegava perto, tentava agarrá-la pela coleira, ao invés de lhe fazer um carinho. Foram tantas as vezes em que não consegui, que ela não veio mais, desconfiada. É como se eu tivesse feito algo errado que o afastava. Mas, sem saber o que foi, continuei fazendo e esse algo o afastava, cada vez mais. E eu via a cachorra sumindo no mato, como via o olhar vago dele, sumindo de mim...
Parece que a culpa é minha se ele agora me olha desconfiado. É minha?
Controle: se a culpa foi minha por deixar a cachorra solta ao abrir o portão... eu controlei isso? Abri o portão pra ele? Mostrei a rua? E, se mostrei, por que ele quis? E, como ela, não atendeu o meu chamado? E não voltou pra mim?
Aí eu me torno assim... tão desinteressante, feia e vazia... muito mais do que a rua cheia de folhas e um galopar pelo mato alto... mas a cachorra foi para mato alto! Isso eu posso entender! E ele... ele entrou em outro portão! E lá ficou, com ele ainda aberto!
Nessa hora, sempre me pergunto o que há errado com o meu portão... como se tivesse algum controle sobre as suas preferências de portões abertos! E sinto vontade de me desculpar, mesmo sem ainda compreender o porquê. Como a cachorra, ele nunca me disse, pois talvez, nem mesmo ele saiba...
Portanto,
perdão,
Me perdoa por ter te mantido do lado de fora do meu portão por muito tempo, te observando lá de dentro com medo de te deixar entrar. Você era um estranho. E eu nada via da sua beleza.
Ignorei a sua vontade de entrar e até ri dela... dessa sua insistência inicial tão bonita, como a da cachorra para sair. Lá dentro, estava ocupado. Você precisou forçar meu cadeado...
Perdão por ter te visto sempre como um visitante e nunca como um morador. Você me parecia por demais vira-latas para querer ficar... e eu não podia me apegar... quando os cachorros fogem para o mato alto, eu fico triste... sinto falta.
Perdão por ter exigido uma postura para permanecer dentro do meu portão. Sei que você queria correr por tudo ao seu prazer, mas eu sou muito dura... quero as coisas como eu quero. Assim como você...
Perdão por não reconhecer todas as suas dimensões e te encarar apenas como um brinquedo novo...
Perdão por não ter corrido atrás de você como nunca, como corri atrás da cachorra hoje de manhã. Quem sabe eu conseguisse também alcançá-lo. Quem sabe, o convencesse a voltar pra casa. Não fiz isso porque pensei... que você sempre fosse estar lá. Porque duvidei do seu ímpeto de ir embora.
Perdão por não ter o portão de sua escolha. Por não caber nos seus sonhos de portões...

Por tudo isso,
eu me perdôo.
E, agora, posso cortar esse cabelo.

sexta-feira, setembro 07, 2007

A nossa amizade

Nossa amizade é estranha. O teu olhar me acalma.
Você me cuida com toda atenção: sempre tentando me deixar confortável.
Pega minhas coisas quando eu as esqueço. E eu acho muito gostoso.
Você me liga e me convida pra almoçar.
É tão natural te encontrar. Meu sorriso se abre espontâneo e o seu também.
Eu te encho muito o saco. E adoro tirar uma com a sua cara. Sei que você também tenta... talvez um dia chegue lá!
Conversamos sobre tudo. Apesar de você não me contar muitas coisas. E eu também não.
Você consola minhas dores, me anima. Brinca muito comigo.
Quando chego nessa cidade, é em você que penso em primeiro lugar. Louca pra te ver! Mas, sem complicações. Você é um carinho pra mim. E eu, um carinho pra você.
Quando estou longe, nem lembro da sua existência. Sei que você também não. Talvez, como eu, só às vezes...
Hoje, tenho pensado mais... tenho pensado de outras formas. Que me dão medo de perder essa cumplicidade que inventamos à primeira vista.
Tenho sentido mais vontade de te tocar do que o usual. Mais vontade ainda de estar junto conversando e encarando seu jeito tímido.
Tenho sentido sua falta...
Fico com medo de acabar confundindo as coisas. Mas... acho que, só por pensar nisso, já devo estar confundindo...
Espero a próxima semana com muito mais vontade. E te encontrar já não está mais tão natural.
Por enquanto, está gostoso brincar desse outro jeito de te gostar...
Isso não quer dizer que eu vá te contar tudo isso. Afinal, a gente não conta tudo um pro outro. Seria bom se você percebesse. E que gostasse também.
Nossa amizade poderia ser de outro jeito, igualmente estranho, mas mais...

Mas se não for, que continue sempre assim: você me chama e eu venho. Eu te conto e você ri. Você pisca e eu entendo. A gente se vê e tudo fica leve...

Saudade da Saudade

Hoje, nesse relance flutuante... te encontrei ao acaso. Não tanto ao acaso, quanto caso. Espiei o lugar e entrei. Imaginei que não era você lá. Mas, era. E beijei seu rosto como se de um conhecido desimportante. Senti seu rosto o de um conhecido. Quando sentia, antes, um completo desconhecido, que me assombrava e me desnudava e me apaixonava.
Vejo você caminhando na rua e penso em sorrir, dar um "tchau". Como qualquer outro ser que caminha o meu caminho oposto. Ensaio o abanar de mãos e me calo. Entalada. Não entendo seus desapegos. Nem pretendo, mais, entendê-los. Mas, respeito. E, de longe, curto uma saudade infantil, que na verdade, nem existe mais.
É saudade da saudade...
Me aquieto por aí. Tento não transcender o teu espaço. E sinto falta do meu, que estava construindo ao seu lado. Acabei perdendo esse espaço no meio de toda aquela confusão. Mas...
Agora eu moro aqui. E você também.
Em que lugar começa a minha casa e termina a tua?
Onde eu ando e você me escapa, parece o lugar certo. Errado mesmo é onde eu ando e você teima em aparecer!
Espaço onde eu não encontro mais o meu caminho pra casinha de cerca branca, com uma cachorra Bonita me esperando na porta.
Aquele bar é meu. O teu era outro. Por que você vai lá?
Parece que vamos acabar nos encontrando mais vezes. Parece também bobo, pensar sobre o que fazer nestas vezes. Mas eu penso, em todas elas.
E me vem à cabeça um mapa mundi dividido: meus territórios pra cá... seus territórios pra lá...
Para continuarmos travando essa guerra fria.
Porque o certo mesmo, seria não te encontrar mais. Mesmo porque, já não é mais você.
É a saudade da saudade...

Devaneios...



Uma outra noite eu acordei. Deparei-me com uma realidade tão cinza, despida de todas as minhas fantasias que já não tinha mais graça. Olhei aquelas pessoas, aquela situação, aqueles sentimentos e estranhei TUDO! O cheiro, a temperatura, as fisionomias, aquelas conversa estranhas... Nada fazia sentido. Busquei uma explicação: por que estava ali? Por que tinha chegado até ali? Eram vampiros e lobisomens sedentos e eu ainda estava ali. Por quê? Eu olhava aqueles olhos, ouvia aquelas risadas e não queria estar ali... Eram outros, não eram mais os mesmos... Ou seria eu não mais a mesma? Os gestos me irritavam, as conversas eu desconsiderava, os planos ignorava, e eles insistiam em estar ali... Por quê?
Num instante de distração, porém, enquanto todos se imginava SER: acordei!

quinta-feira, agosto 30, 2007

ESPERA


No começo era o natal.
Depois o aniversário,
As férias, os amiguinhos, a manhã de sol na praia...
Depois o retorno, os colegas, a nova professora, mais um ano!

Mais tarde esperava apenas o fim de semana.
A festa
O flerte
O beijo...
Xiii e depois?

Mais velha esperava o amor.
Esperava tanto, que perdia a vez!
E depois esperava a tristeza passar...

Encontrei o amor e continuo esperando:
Que ele fale,
Que peça,
Que toque,
Que me ame e não espere...

quarta-feira, agosto 29, 2007

Minha bagagem...

Meu coração vive de pulos, entre o mundo que eu criei e você.

Entre o você que eu criei e meu mundo.

Já nem sei mais aquilo que fica no meio desse caminho, que percorro de olhos fechados, de cabeça nas nuvens, descalça, despida, desarmada.

O que carrego comigo é toda minha história, minhas bobagens, meus medos, meu vazio, minhas alegrias, minhas vontades, saudades e esse amor que não sei direito quando chegou ou desde quando carrego, quando dei por mim ele já ocupava boa parte da minha bagagem.

Por quanto tempo irei carregá-lo também não sei, meses, anos, décadas...a vida? Como diz o poeta “que seja infinito enquanto dure”.

Tarde da Noite

de ontem, me deu uma saudade enorme de gostar de você.
Daquele jeito de antes, nada calmo, nada certo. De ficar aflita.
Me deu saudades daquelas noites, em que reconheci em seus olhos, os porquês de tanta vontade de entender os seus porquês.
Nada acontece por acaso:
os seus porquês ficavam estampados nos olhos.
Eu não precisava perguntar,
às vezes basta só o olhar...
Tanta vontade um do outro...
Não tinha como ir muito longe...
Éramos dois brinquedos novos... daqueles que os nosso pais não deixam a gente brincar!
E a vontade tende ao infinito...
Lembro de caminhar à noite na praia e pensar em você demais...
e ser bom demais...
Mas você não sabia que toda hora era a hora certa...
E por isso, te neguei tanto, mas tanto, mas tanto...
que fiz disso uma verdade...
com outro alguém pra se pensar...
como tudo que assumo com enorme convicção.
Um sentimento desses não poderia esperar...
poderia?
porque me deu uma saudade enorme de gostar de você, tarde da noite de ontem.
E... se toda hora é a hora certa...
Me pergunto por onde você anda.
Que não vem aqui pra me beijar...

quinta-feira, agosto 23, 2007

O que eu faço com o que me dás...


Maldita evolução. Maldita capacidade de abstração, imaginação e invenção, que permitem meu cérebro transformar fatos em sonhos e devaneios. Não seria ruim se pudesse recriar apenas os sonhos. Mas você, você me faz criar desejos que nunca sairão das minhas fendas sinápticas. Nunca serão efetivamente ações, quero dizer suas ações. Apesar de saber disso continuo...

Permito que meus neurônios produzam e reproduzam sensações que um dia existiram (de verdade), que um dia o tempo e o vento levaram, junto com a calma da minha mente e a paz do meu coração. Agora vivo fazendo remendos com as coisas que me dás...

De uma brincadeira boba faço um elogio à minha inteligência, de um abraço meio sem jeito, faço um “te quero pra mim”. De um afago nos cabelos faço uma declaração de amor. E quando me mostras a língua como uma criança mal criada leio o desejo de um beijo, ardente como aqueles, de antes, de sempre (na minha mente).

quarta-feira, agosto 22, 2007

Aconteceu


de um belo dia eu cruzar o seu caminho e você me assassinar. Assim, como quem ferve uma água para passar um café, passou então, na sua orelha, uma idéia esquisita que apontava o meu falecimento como porta de entrada a alguma dimensão nova, daquelas que se fica imaginando quando se pode relaxar, sabe?
E não é que você me dá quatro tiros e sai andando, como se nada fosse, me largando ali na rua de baixo, enquanto eu ainda ensaiava o meu “bom dia” educado?
Fechei os olhos, enquanto me esparramava na borda da calçada e levava as mãos ao peito. Era sangue?
Era sangue! E era preto e gosmento e com um gosto de ferro que deus me perdoe!
Nessa hora derradeira, ao invés de constatar a dor, a morte, de juntar forças para gritar, pra ver se alguém me ouvia (e me ajudava e me salvava), o meu cérebro e o meu corpo se concentraram na configuração de uma teoria sobre a razão do meu homicídio.
Nenhum sinal de ambulâncias.
Será que eu tinha ofendido esse rapaz? De alguma forma? Xinguei tua formosa progenitora, sem perceber? Desdenhei da tua brilhante genialidade? Fiz pouco caso do teu penteado novo? Do teu emprego novo? Dessa tua (do mundo) sensação dicotômica de amargura/expectativa perante a vida?
Nenhum sinal de médicos.
Haveria você enlouquecido? Perdido a razão durante a guerra interna que travou? Estaria machucado, como um bicho que escapou de mais armadilhas do que possa se lembrar e agora se ressabia de tudo que o cerca? Estaria sob o efeito de drogas alucinógenas e me viu como inimigo? Ou... apenas me viu como um inimigo? Ou... será que sou o inimigo? E, se sou o inimigo, por que sou o inimigo?
Nenhum sinal de pessoas vindo em meu socorro.
Teríamos acordado, cada um em lado oposto da cama, sem nos reconhecer enquanto irmãos? Ou nos reconhecendo enquanto irmãos, como Caim e Abel, disputando o mesmo saco de farinha do qual são feitos os sonhos?
Nenhum sinal de sirenes.
E nada, nada anunciando a minha morte. A não ser essa dor e o gosto de ferro.
Mas... será que não me vêem? Estou ali, jogada na calçada, agonizante!
Na verdade estava longe de agonizar. Tão concentrada na resolução do meu quebra-cabeça inventado, obcecada eu diria, que não emitia som que fosse...
E nem pra você voltar e me dar uma explicação! Ou para se arrepender, recobrar os sentidos e se desculpar pelo imprevisto ato de insanidade.
Nem um médico passando! Nada. Nada!
Ocupada demais para me ocupar do meu próprio resgate, continuei confabulando até que... senti meu bolso vibrar e ouvi a musiquinha ridícula do celular tocando. Era um amigo, perguntando se eu ia ao bar. Respondi que não, pois estava ocupada e desliguei.
Adentrei novamente as minhas neuroses, investigando as razões. Passei mais algumas horas tentando compreender o que havia acontecido. E quando a febre foi se formando uma nuvem de pensamentos desconexos sem relações causais que os suprissem, avaliei que era hora de tomar alguma providência...
Levantei da calçada e tropecei até o ponto de táxi da rua de cima. Dei instruções ao mocinho simpático e preocupado para me levar a um hospital.
No caminho, cheguei à conclusão de que nunca ia compreender o que acontecera. O modo como estruturamos nossos pensares pertence a um lugar sobre o qual não temos nenhum controle, apesar de termos, sempre, essa vontade de controlar tudo o que nos cerca. Inclusive os pensares e os pesares do outro.
Agora, na mesa de cirurgia, as lâmpadas estão se apagando. Dois últimos desejos: que as balas se desalojem do meu peito, para que novamente eu possa estufá-lo e voltar a caminhar, sem medo, pela rua de baixo. E que eu ocupe minha mente com outras coisas quando fizer isso.

quinta-feira, agosto 16, 2007

Dia do solteiro: liberdade ou solidão?



Passei algum tempo querendo ser solteira outra vez.
Queria passar horas com as amigas me arrumando antes da balada e outras tantas depois, recapitulando cada estratégia e fazendo o balanço da noite!
Queria mais espaço na cama, no armário. Queria decidir o sabor da pizza sozinha! Queria ler na cama até adormecer, sem incomodar alguém com a luz do abajur... Queria passar mais tempo no banho e ter apenas uma toalha no banheiro, para não pegar sempre a molhada!
Queria sair sem hora para voltar, sem destino, sem cobranças, sem limites.
Não queria ver futebol todas as quartas.
Não queria disputar a coberta nem juntar as roupas espalhadas.
Não queria me sentir insegura enquanto ele não voltava!
Não queria sentir ciúmes das amigas do trabalho que eu nem mesmo conhecia!
Não queria ter que estar bonita cheirosa e disposta sempre...

Hoje no dia do solteiro estou sozinha... Estava num bar com umas amigas e desejando outras coisas...

Hoje eu queria dividir a cama, a toalha, o banho!
Queria um pezinho quentinho esquentando o meu.
Eu até assistiria futebol! Comentando e torcendo junto (pro mesmo time claro)!
Ah como eu queria! Queria cozinhar alguma coisa, por a mesa, mesmo sabendo que ele iria comer em frente a TV.
Queria alguém me ligando: “que horas você chega?”, “vem logo, tô te esperando...”
Queria alguém pra me buscar. Alguém pra dizer “quem sabe a outra blusa”.
Queria alguém para escolher o filme e apagar a luz.
Alguém pra me fazer carinho, pra eu contar meu dia e ouvir o seu.
Queria dormir de mãos dadas e ser incomodada no meio da madrugada com beijinhos na nuca... E acordar atrasada, deliciosamente feliz, por ter alguém!

quarta-feira, agosto 08, 2007

Sonhar e ser sonhado


Geralmente sou eu quem sonho com as pessoas em situações inusitadas. São sonhos tão cheios de detalhes que às vezes acordo cansada! Ah sim, sereias também dormem! Mas hoje eu fui parte de um sonho. Que surpresa! Fui objeto de desejo de uma moréia... Ela narrou uns poucos detalhes enquanto censurava outros.
Estranhamente fui tomada por um misto de sentimentos entre o prazer de ser desejada e o medo da expectativa criada. Que teria feito eu neste sonho?
A sensação de ser recriada nas fantasias do outro me assustou simplesmente pelo fato do outro não ser exatamente aquele outro que eu desejava que fosse! Ainda assim em senti bela!
Depois do breve encontro pus-me a pensar o que são de fato os sonhos?
Será que perdemos o controle ou induzimos nossas mentes?
Seriam os sonhos lugares mágicos, onde as vontades do outro não importam, por ser uma realidade individual?
Ah como eu queria que aquele peixe-espada sonhasse comigo... Como eu queria que me desejasse ardentemente e me possuísse com a agressividade de uma moréia que na espreita não perde a oportunidade, ainda que em sonhos!
Ah como eu queria controlar os meus! Sonharia com ele todas as noites! Viveria com ele todas as emoções que a racionalidade da vigília não permite. Levá-lo-ia ao êxtase de tal forma que jamais desejaria acordar!
Porque os sonhos são apenas de quem sonha. E tudo pode! Vou dormir.

Eu mereço?? EU NÃO MEREÇOOOO!!!


E, não, eu não tava no bar. Pelo contrário: acordei mordida, puta da vida, do avesso mesmo. Tava mal-humorada, chata pra caralho! Tudo dando errado, tudo caindo por terra. Beleza. Quando eu tou assim, preciso de endorfinas. É, não há cerveja que dê conta, preciso de relaxante na veia mesmo, direto no meu cérebro!
Resolvi então, fazer o que sempre funciona: correr. Mas correr pra caralho mesmo. Uma hora seguida, ritmo forte... o quê, pra uma fumante inveterada, é o máximo que se pode atingir...
Botei minha roupinha meiga de boxe thai e fui pra pista. E me dirigi, alegre e contente, pra um parque que tem aqui perto de casa.
Chegando lá, me alonguei, enchi meu peito de coragem, acertei o cronômetro e comecei.
Lá pela terceira volta, passa um sujeito ao meu lado, correndo. Ele dá uma diminuída no ritmo dele e começa a me acompanhar, já puxando um papinho furado:
- Muay thai?
- É.
- Treina onde?
- Aqui perto, na rua blábláblá.
- Hum... eu treino jiu jitsu.
E o quico? Perguntei alguma coisa?
- Ah é? Interessante...
- Treina há quanto tempo?
- Uns cinco anos.
- Vem sempre correr aqui?
Eu mereço? Até na pista de corrida os caras não têm outro papinho?
- Não, é a primeira vez. Nem sabia se tinha pista, vim ver qual era.
- Ah tá. Eu corro aqui sempre.
Caralho. Eu não vim aqui pra jogar conversa fora. Quando eu quero jogar conversa fora, vou pro bar!
Tudo bem! Tudo bem! Sendo paciente, sendo social... você consegue! Afinal, já ia escurecer, e o tal parque não era exatamente o que se pode chamar de “bem freqüentado”, à noite. Se o cara continuar correndo comigo, tá beleza. E fui eu, correndo e engolindo o papo furadíssimo do mané. Conversamos aquelas coisinhas básicas: faz o que, quantos anos você tem, mora com a mãe, casada, enfim, aquelas baboseiras de sempre.
Acelerei o passo e cortei o papo. Não dava pra conversar naquele ritmo.
Corremos pra caralho. E, pelo visto, o cara corria mesmo, senão não agüentava. Fui diminuindo, pra fazer umas flexões, me alongar, etc.
E o papinho continuava. Tudo bem, pensei, não faz mal jogar conversa fora. Fui fazer uns abdominais...
E não é que o sem-noção vem botar a mão dele na minha barriga, com a desculpinha vagabunda de que queria ver se eu tava usando os músculos certos?
Fala sério porra! Eu não preciso de instrução! Faço esta merda há mais de cinco anos!
Afastei delicadamente a mão da ameba da minha barriga e continuei. Mas tava foda. O cara não dava sossego! Tudo que eu ia fazer, ele queria dar palpite. E os palpites dele sempre envolviam encostar em mim! E eu odeio que me toquem quando eu não quero, quando eu não conheço, quando eu não tou a fim!
Não me entendam mal... o cara até era gato. Mas era um boçal também! E eu não tava a fim de paquera porra! Tava a fim de correr! De suar! De não pensar em nada!
Mas, beleza, eu preciso aprender a ser educada, como minhas amigas têm me falado. A não mandar os caras pro inferno, porque nem todos eles tão a fim de mim e blábláblá. Ok.
Me enchi o saco. Fui indo pra saída. O cara tava de moto e me ofereceu uma carona. Sobre a carona:
1. Tenho pavor de andar de carona de moto. Se eu dirigir, menos mal, mas de carona, morro de medo;
2. O cara não tinha um capacete extra pra mim;
3. Era óbvio que o cara queria me pegar. E eu não!
- Olha, eu vou agradecer, mas vou andando. Tenho medo e blábláblá. Vou fazer o seguinte: vou pegar teu telefone e, quando vier correr de novo, te dou um toque, que tal?
- Tá, então arruma uma caneta.
- Beleza.
E... toca parar todo mundo que passa na rua atrás de uma caneta. Finalmente consegui. (eu sou boazinha demais e ninguém me dá crédito! Eu deveria ser canonizada pelo exercício freqüente da paciência em momentos abomináveis).
Quando estou anotando o telefone do tanso, aconteceu! Foi o auge do meu azedume! Eu não mereço isso!
- Aê gata, vamos dar uns beijos?
Bah... não! Não! Não!
Porraaaaaa!!!!!!
O cara tem 32 anos nas costas! Sabe que eu tenho quase 30! Meu deus! Isso é coisa que se diga pra uma mina de quase 30 anos? Eu não ouvi isso nem com 15! De moleques de 15!
“Vamos dar uns beijos?”!!!! Caralhoooooooo! O que esse animal tem no cérebro? Uma balinha de iogurte? Um coágulo que impede o raciocínio e a convivência pessoal?
Olha, eu acho que devo estar virando careta, ou que devo ser mesmo muito romântica, porque, honestamente... cara, que feio! Sabe feio? Foi feio!
Onde esse cara aprendeu isso? Numa letra de funk? Aposto que na próxima ele vai dizer “ae gata, eu vou morder o seu grelinho”...
Mas, o pior é que eu, nessas de tentar ser educada e não magoar a pessoa em questão, deixei de lado minha posição de educadora e dei uma de falsa moralista:
- Olha, você é legal, mas eu não sou assim... eu não curto sair beijando as pessoas que acabei de encontrar. Eu curto conhecer o cara antes, saca? (mentiraaaa)
- Mas a gente tá se conhecendo há duas horas, a gente se conhece pô, a gente correu junto!
- Não, mas isso nem é conhecer... eu não sou assim (mentiraaaa! e... deslavadaaa!)... faz assim: eu te ligo, a gente vem correr um outro dia e, quem sabe, a gente se conhece melhor (mentira! Esse telefone vai direto pro lixo! Melhor, vai pro inferno, que deve ser de onde você veio também, sua desgraça!).
- Ah gata, que é isso? A gente se conhece melhor beijando. Vamos dar uns beijos, vai?
- Cara, por que eu te daria uns beijos? Que que a gente ganha com isso? Eu nem te conheço, não tou a fim, deixa quieto. Outro dia eu te ligo, beleza? Até mais.
- Tá bom gata. Me liga, hein?
Claro... nos seus sonhos. Nos teus sonhos, ligar-te-ei!
Eu deveria ter feito um favor à humanidade e descascado aquela pessoa! Olha aqui meu filho, tu tens 30 anos nas costas e espera ficar com uma mulher dizendo pra ela “vamos dar uns beijos gata”? Você é bobo ou comeu merda? Isso é jeito? Antes tentasse me beijar na boca de uma vez!
Sabe o que é pior? Eu não dei mole pro cara! Mas, parece que, se a gente pára pra conversar com alguém, pra alguém te acompanhar numa corrida, isso significa “quero te dar”. Não! Não! Melhor: significa “quero te dar muuuuuito”! Fala sério!
Olha, tudo bem que eu não estivesse nem um milésimo de milímetro interessada por aquele cara. Ele não me atraía em absolutamente nada, é bem verdade. Mas, porra, se o Brad Pitt tivesse um papo tão besta e me dissesse “vamos dar uns beijos gata”, eu mandava ele ir pro inferno também! Eu acho o Brad Pitt tudo, mas, assim mesmo, EU NÃO MEREÇO!!!!

terça-feira, agosto 07, 2007

Sobre um outro amor...

Não há momento mais oportuno para me apresentar...
Enquanto Pandora sofre com o medo da entrega eu me afogo numa entrega absoluta.
Como uma bela sereia, tenho o poder da sedução. Minha voz é meu encanto, ainda que meu canto seja apenas palavras recitadas numa retórica métrica que não é minha. Que é reconstruída a partir do discurso dos que me rodeiam, dos que me apaixonam... Mas o poder, esse sim é meu.
E o amor é para mim uma prisão. Fui condenada a amar demasiadamente, indiscriminadamente, como num feitiço... Feitiço que me cala e me aniquila por uma chance de conquistar um amor...
Aos meus olhos nada parece desprezível, nada é descartável, fantasio encontrar o lado bom de todas as coisas, de todas as pessoas como se meu encanto pudesse despertá-los...
Entrego-me ao amor e ao outro para não ceder às minhas próprias exigências.
Falta-me coragem para impor os limites. Não me autorizo a reprimi-los ainda que isso custe a minha sanidade... É como se Netuno me impusesse certa sujeição. Mas minha submissão é meu domínio, e isso eles não percebem. Num jogo velado faço de conta que perco, mas ganho e ainda assim não me satisfaço, porque eu quero a totalidade. Ora como uma sereia vampira, desejo tê-los inteiramente. Mas isso não é possível porque os pobres mortais não são completos. Vivem uma dicotomia insana entre a razão e emoção. Eu pelo menos opciono pelos meus sentimentos!

segunda-feira, agosto 06, 2007

Escutando minhas amigas....





Uma amiga pediu pra eu postar meus rascunhos,

mas achei melhor escrever algo relacionado ao

que anda acontecendo neste momento da minha vida....



Ando naquela busca incessante de me conhecer, me respeitar, me amar.... e lógico, um emprego.....
Engraçado que acontecem algumas coisas na vida da gente TOTALMENTE inesperadas....
Um dia.... mensagem no celular.... pensei: "amigas, né, quem mais?"

Vou olhar e
SURPRESAAAAAAAAAA!!!!!!!!!!!

a 1ª paixão da minha vida me viu na rua e mandou mensagem.... perguntando se podíamos nos encontrar....
Pra encurtar... ta maravilhosooooooo!!!

Não sei o que vai acontecer, mas pelo menos (depois de tanto tempo) é um homem que me valoriza.....
Quanto tempo vai durar? Não sei... só sei que quando tenho oportunidade de estar ao lado dele, esqueço completamente do mundo.....

Bem.... por falar em escutar as amigas.....
Tô aprendendo a deixar meu lado "PSICOPATA" trancado num cofre.... (lógico que nenhum cofre é totalmente seguro...)

Sobre o meu amor

Tenho tentado, devo dizer, quando me entrego a amar os outros e desejo satisfazê-los em suas condições. Porém, logo me torno arredia e com medo de me perder nessas outras pessoas e fujo, desesperada, me trancando novamente em minha tão estimada solidão.
Sento no quarto, acendo um cigarro na cama, antes de dormir e me ponho a imaginar tantas diversas cenas de amor quanto se possa criar em tão pouco tempo dessa existência.
Choro sozinha e, ainda assim, não poderia estar mais satisfeita.
Declaro-me, então, uma amante. Assumo a impossibilidade de me tornar esta mulher que todos proclamam como necessária à felicidade habitual do ser feminino.
Meus desejos de amor são ideais, mas não maternais no sentido da freqüência permanente.
Imagino retratos de horas curtas, porém metafisicamente intermináveis, de cumplicidades e carinhos que não se concede a qualquer um, mas apenas a poucos escolhidos pelas minhas vaidades. Nestes momentos, estou plenamente entregue e amando em absoluto todas as feições daquele ser com quem os compartilho: os olhos brilhantes de quem conta um segredo doloroso, o sorriso de prazer sexual, o silêncio que precede as partidas, ou uma conversa boba sobre o que quer que seja. Nestes momentos reside a minha fidelidade mais extremada, minha total devoção! Mas eles devem permanecer esparsos (...)
Idealizo estas relações como uma crua dama que se apresenta de tempos em tempos, dirigindo todos os esforços para proclamar estas horas de afeto. E aí se mostra a minha especialidade: eu não devo ficar, ou os momentos se tornam banais. E esta banalização do meu amor significa a minha própria morte.
Ficando, prova-se da minha humanidade, das minhas fraquezas e feiúras. Vou largando meu corpo em sua companhia, mas professo, alto e bom som: sou uma promessa de adeus; sou uma saudade que já se sente.
É um desejo de irradiar tanta luz das estrelas que se escape pelas mãos, que não se possa contê-la, que se lance para todo o infinito. O desejo do encantamento sobrenatural do outro, de tanto amor e paixão que me afoguem e me embruteçam, a ponto de me fazer partir sem olhar para trás. Amo assim, como uma gueixa.
Meu desejo é tornar-me mito: tão belo, tão forte, tão sensual e desejado, quanto inacessível. Não posso, de maneira alguma, ser possuída.
Algumas vezes, porém, sinto um estranhamento perante alguns outros seres: desejo ficar, precisamente quando mais deveria desejar ir embora. Desejo ficar nos momentos mais perigosos, aqueles em que eu me perderia, esparramada pelas entranhas psicológicas de algum outro ser... algum destes que me arrebatam e me arrepiam os pelos do pescoço...
Mas, o destino então me protege, cumpre seu papel: ele me assombra! Lembra-me de responsabilidades e comprometimentos que me assustam, me dão medo. Como criança que ainda sou, não tenho coragem de me dedicar a um outro, se esta dedicação tomar por demais o meu tempo e meus pensamentos, que ainda estão, em demasia, voltados para mim.
Então me exponho inacessível! Mostro toda a impossibilidade de me manter ao redor: a estrela, esta devo ser eu. E aos outros pobres mortais, estes sim, que me rodeiem, como belos planetas me orbitando!
Eu firo os outros seres, como uma torturadora. E eles me mandam embora! Mal sabem que sou eu quem os conduz, através de leves espetadas em locais estratégicos, formando feridas que nunca se fecham, jorrando sangue aos poucos, até que se esvaia toda a paciência ali contida, toda a possibilidade de suportar a difícil tarefa de me amar.
pois, se alguém suportasse...

Mantenho-me, pois, na fantasia, na efemeridade. Prefiro devorar estes amores. Alimento-me destas histórias de amor e não consigo, ainda que deseje, aprofundar-me na alma do outro, por mais que, muitas vezes, seja isso que deseje! Perder-me em absoluto, me dedicar em absoluto, apagar um pouco que seja deste “brilho de dama da luz das estrelas”.
Parece-me que perdê-lo, apagá-lo, torna-me escrava. Torna-me menos amável, menos encantadora e, por isso mesmo, mais vulnerável. E, nesta hora em que meu brilho se apaga, não mais me amarão, pois este amor é exatamente fruto desse brilho. E eu estarei tão entregue, que não terei forças para voltar a brilhar... faço, portanto, esse serviço: antes que me entregue e meu brilho se apague, apago-o, eu mesma, e parto.
Mas, pensando no que às vezes desejo de mim, nesta curiosidade de me perder inteiramente num outro, vejo que talvez não possa me oferecer. Não imagino amarras ao meu tão grande amor pelas coisas e pessoas. Esse meu amor é por demais livre e, por isso mesmo, muitas vezes me sufoca e me afoga e me desvia dos caminhos mais retos... este amor é, antes de tudo, pela minha própria existência, pelos meus prazeres. Meu amor é um poço de egoísmo.
Talvez compreender a sua natureza e amansá-lo como a um cavalo selvagem...
mas destituí-lo de sua condição rebelde pode significar, também, despi-lo de sua beleza tão singular.

quinta-feira, agosto 02, 2007

Remoto Controle


Separa essa solidão em dois fragmentos: um sem graça, sem cheiro, sem textura, sem vontades. Outro, dourado nos sonhos mais sórdidos de uma freira que nunca se entregou.
Movendo para trás os anseios, para frente os medos, me aparece, de manhã, aquela vida sem graça, da qual se respira o frio da mesma madrugada que atravessa as linhas que atravessam o ser que atravessam... não ser mais.
Corre subir as escadas para o carinho do destino e permanece quieta de manhã. Cala a boca. Calabooooooooocaaaa!
Libera o controle para as mãos que o merecem – aquelas que pendem dos braços das mães que amamentam com dor os rebentos. Aquelas que te protegem ou te curam... ou... te estrangulam, sem saber.
Admita, então, a perda do controle! Admita perder o passo, o fôlego, a ilusão de seguridade. Tem coragem?
Deixa que se esvaia sozinha e devagar a juventude e não te inquietes mais:
No fim, nunca era você, nem ele, nem eu. Nunca foi nada, além de imagens projetadas na grande tela dos olhos dos outros.
E lá, refletidos, já não mais nos reconhecemos e nos regozijamos pelas convicções de que estarão certos apenas os insanos.
Então deixe! Deixe, que no fim do dia muda-se de idéia e agrega-se de novo ao rebanho dos novos hospícios, fingindo ser normal, como eles. Espalhando por aí essas novíssimas idéias de paz, amor e prosperidade, como se fosse natal de novo, como se quisesse, de novo, entrar naquela neurose de fim de ano e controlar e controlar e controlar a sua vida.
Ou... deixa ao acaso então! Isso mesmo:
Cala a boca!