segunda-feira, agosto 06, 2007

Sobre o meu amor

Tenho tentado, devo dizer, quando me entrego a amar os outros e desejo satisfazê-los em suas condições. Porém, logo me torno arredia e com medo de me perder nessas outras pessoas e fujo, desesperada, me trancando novamente em minha tão estimada solidão.
Sento no quarto, acendo um cigarro na cama, antes de dormir e me ponho a imaginar tantas diversas cenas de amor quanto se possa criar em tão pouco tempo dessa existência.
Choro sozinha e, ainda assim, não poderia estar mais satisfeita.
Declaro-me, então, uma amante. Assumo a impossibilidade de me tornar esta mulher que todos proclamam como necessária à felicidade habitual do ser feminino.
Meus desejos de amor são ideais, mas não maternais no sentido da freqüência permanente.
Imagino retratos de horas curtas, porém metafisicamente intermináveis, de cumplicidades e carinhos que não se concede a qualquer um, mas apenas a poucos escolhidos pelas minhas vaidades. Nestes momentos, estou plenamente entregue e amando em absoluto todas as feições daquele ser com quem os compartilho: os olhos brilhantes de quem conta um segredo doloroso, o sorriso de prazer sexual, o silêncio que precede as partidas, ou uma conversa boba sobre o que quer que seja. Nestes momentos reside a minha fidelidade mais extremada, minha total devoção! Mas eles devem permanecer esparsos (...)
Idealizo estas relações como uma crua dama que se apresenta de tempos em tempos, dirigindo todos os esforços para proclamar estas horas de afeto. E aí se mostra a minha especialidade: eu não devo ficar, ou os momentos se tornam banais. E esta banalização do meu amor significa a minha própria morte.
Ficando, prova-se da minha humanidade, das minhas fraquezas e feiúras. Vou largando meu corpo em sua companhia, mas professo, alto e bom som: sou uma promessa de adeus; sou uma saudade que já se sente.
É um desejo de irradiar tanta luz das estrelas que se escape pelas mãos, que não se possa contê-la, que se lance para todo o infinito. O desejo do encantamento sobrenatural do outro, de tanto amor e paixão que me afoguem e me embruteçam, a ponto de me fazer partir sem olhar para trás. Amo assim, como uma gueixa.
Meu desejo é tornar-me mito: tão belo, tão forte, tão sensual e desejado, quanto inacessível. Não posso, de maneira alguma, ser possuída.
Algumas vezes, porém, sinto um estranhamento perante alguns outros seres: desejo ficar, precisamente quando mais deveria desejar ir embora. Desejo ficar nos momentos mais perigosos, aqueles em que eu me perderia, esparramada pelas entranhas psicológicas de algum outro ser... algum destes que me arrebatam e me arrepiam os pelos do pescoço...
Mas, o destino então me protege, cumpre seu papel: ele me assombra! Lembra-me de responsabilidades e comprometimentos que me assustam, me dão medo. Como criança que ainda sou, não tenho coragem de me dedicar a um outro, se esta dedicação tomar por demais o meu tempo e meus pensamentos, que ainda estão, em demasia, voltados para mim.
Então me exponho inacessível! Mostro toda a impossibilidade de me manter ao redor: a estrela, esta devo ser eu. E aos outros pobres mortais, estes sim, que me rodeiem, como belos planetas me orbitando!
Eu firo os outros seres, como uma torturadora. E eles me mandam embora! Mal sabem que sou eu quem os conduz, através de leves espetadas em locais estratégicos, formando feridas que nunca se fecham, jorrando sangue aos poucos, até que se esvaia toda a paciência ali contida, toda a possibilidade de suportar a difícil tarefa de me amar.
pois, se alguém suportasse...

Mantenho-me, pois, na fantasia, na efemeridade. Prefiro devorar estes amores. Alimento-me destas histórias de amor e não consigo, ainda que deseje, aprofundar-me na alma do outro, por mais que, muitas vezes, seja isso que deseje! Perder-me em absoluto, me dedicar em absoluto, apagar um pouco que seja deste “brilho de dama da luz das estrelas”.
Parece-me que perdê-lo, apagá-lo, torna-me escrava. Torna-me menos amável, menos encantadora e, por isso mesmo, mais vulnerável. E, nesta hora em que meu brilho se apaga, não mais me amarão, pois este amor é exatamente fruto desse brilho. E eu estarei tão entregue, que não terei forças para voltar a brilhar... faço, portanto, esse serviço: antes que me entregue e meu brilho se apague, apago-o, eu mesma, e parto.
Mas, pensando no que às vezes desejo de mim, nesta curiosidade de me perder inteiramente num outro, vejo que talvez não possa me oferecer. Não imagino amarras ao meu tão grande amor pelas coisas e pessoas. Esse meu amor é por demais livre e, por isso mesmo, muitas vezes me sufoca e me afoga e me desvia dos caminhos mais retos... este amor é, antes de tudo, pela minha própria existência, pelos meus prazeres. Meu amor é um poço de egoísmo.
Talvez compreender a sua natureza e amansá-lo como a um cavalo selvagem...
mas destituí-lo de sua condição rebelde pode significar, também, despi-lo de sua beleza tão singular.

Um comentário:

Medusa disse...

Olha isso tem nome: histeria! rs
brincadeira, mto lindo o texto. beijos