Fechado para balanço, dizia a placa na porta. E em letras bem miúdas: por tempo indeterminado. Há tempo esperava esta hora, embora não quisesse. Passara muitos anos fornecendo flores, ora triste, ora feliz.
Guardava num canto especial da floricultura uma pedra de cristal. Sabia que seus poderes estavam além do amuleto. Ainda assim conservava-o como ente de contemplação. Como se pudesse vislumbrar os ciclos, repetidos por milhares de anos, fitava a rocha como às pessoas. Podia apreender os detalhes. E até então, usara seus poderes para vender as flores.
Desejava que todos pudessem apreender a beleza flores, que pudessem sentir o perfume das rosas, que gastassem um tempo com a simetria das compostas, ou que pudessem admirar a majestosa masculinidade nas anteras dos lírios. Queria que deixassem seduzir-se pelas Nymphaeas. Sentia profundo prazer em contar sobre as flores, mas não conseguia lidar bem com o desinteresse alheio.
Gostava mesmo das pessoas que não sabiam o que procuravam. Sentia um imenso prazer ao saber das histórias e sugerir flores, às vezes folhas. Certa vez chegou um senhor docemente triste. Buscava lírios brancos. E não foi difícil saber pra quem. As perdas são sempre compartilháveis. Mas havia tanto amor em seu coração. Ela então sugeriu rosas. Vermelhas e amarelas. Mas no cemitério? Por que não? Todos acabavam por se render aos sinceros olhos, tão verdes quanto às folhas de um filodrendron. Havia um poder estranho naquele jeito de olhar. Parecia penetrar na alma como raízes em busca de água.
Tinha uma paciência invejável. Recebia a todos com alegria, até mesmo aqueles que buscavam nas flores alternativas para a falta de tempo ou de criatividade. Então fazia do presente o seu presente. Nessas horas emergia um sentimento estranho... Sentia-se triste diante da pressa, do descuido, da loucura do mundo moderno... Recusava-se a fornecer flores para grandes eventos. Sabia que terminariam todas esquecidas num salão às escuras. E ela tinha demasiado apreço por suas flores.
Certo dia, do outro lado da rua, sua morte fora anunciada. Inauguraram uma loja de artigos de decoração especializada em vasos e plantas artificiais. Queria acreditar que as pessoas não se deixariam levar por tamanha futilidade. Queria crer que o romantismo das rosas, a alegria das margaridas, a elegância dos lírios e o aroma dos jasmins eram insubstituíveis... Estava errada.
Certa noite, debaixo de um céu estrelado, a senhora pensou em todas as coisas que vivera até aquele dia. Pensou nas pessoas, em seus sentimentos e suas intenções. Pensou nos contra censos. Lembrou alguns dias especiais. Calculou todo seu esforço e com algumas lágrimas nos olhos tomou sua decisão. Embora já soubesse, custou-lhe muito. Calmamente desenhou a placa. Queria ainda acreditar que não seria para sempre. Escreveu, portanto, por tempo indeterminado. O balanço, na verdade, estava feito. Mas não podia abandonar completamente seus sonhos, suas plantas, seu ponto, sua história, sua luta e sua vida... Igualmente não podia abandonar sua alma.
Porém, o mundo novo e suas exigências eram insustentáveis diante daquele jeito simples e meigo de encarar a vida. E com a noite ainda escura, despediu-se de cada plantinha, apanhou alguns copos-de-leite, pegou a pedra... Pendurou a placa na porta e se foi.
Guardava num canto especial da floricultura uma pedra de cristal. Sabia que seus poderes estavam além do amuleto. Ainda assim conservava-o como ente de contemplação. Como se pudesse vislumbrar os ciclos, repetidos por milhares de anos, fitava a rocha como às pessoas. Podia apreender os detalhes. E até então, usara seus poderes para vender as flores.
Desejava que todos pudessem apreender a beleza flores, que pudessem sentir o perfume das rosas, que gastassem um tempo com a simetria das compostas, ou que pudessem admirar a majestosa masculinidade nas anteras dos lírios. Queria que deixassem seduzir-se pelas Nymphaeas. Sentia profundo prazer em contar sobre as flores, mas não conseguia lidar bem com o desinteresse alheio.
Gostava mesmo das pessoas que não sabiam o que procuravam. Sentia um imenso prazer ao saber das histórias e sugerir flores, às vezes folhas. Certa vez chegou um senhor docemente triste. Buscava lírios brancos. E não foi difícil saber pra quem. As perdas são sempre compartilháveis. Mas havia tanto amor em seu coração. Ela então sugeriu rosas. Vermelhas e amarelas. Mas no cemitério? Por que não? Todos acabavam por se render aos sinceros olhos, tão verdes quanto às folhas de um filodrendron. Havia um poder estranho naquele jeito de olhar. Parecia penetrar na alma como raízes em busca de água.
Tinha uma paciência invejável. Recebia a todos com alegria, até mesmo aqueles que buscavam nas flores alternativas para a falta de tempo ou de criatividade. Então fazia do presente o seu presente. Nessas horas emergia um sentimento estranho... Sentia-se triste diante da pressa, do descuido, da loucura do mundo moderno... Recusava-se a fornecer flores para grandes eventos. Sabia que terminariam todas esquecidas num salão às escuras. E ela tinha demasiado apreço por suas flores.
Certo dia, do outro lado da rua, sua morte fora anunciada. Inauguraram uma loja de artigos de decoração especializada em vasos e plantas artificiais. Queria acreditar que as pessoas não se deixariam levar por tamanha futilidade. Queria crer que o romantismo das rosas, a alegria das margaridas, a elegância dos lírios e o aroma dos jasmins eram insubstituíveis... Estava errada.
Certa noite, debaixo de um céu estrelado, a senhora pensou em todas as coisas que vivera até aquele dia. Pensou nas pessoas, em seus sentimentos e suas intenções. Pensou nos contra censos. Lembrou alguns dias especiais. Calculou todo seu esforço e com algumas lágrimas nos olhos tomou sua decisão. Embora já soubesse, custou-lhe muito. Calmamente desenhou a placa. Queria ainda acreditar que não seria para sempre. Escreveu, portanto, por tempo indeterminado. O balanço, na verdade, estava feito. Mas não podia abandonar completamente seus sonhos, suas plantas, seu ponto, sua história, sua luta e sua vida... Igualmente não podia abandonar sua alma.
Porém, o mundo novo e suas exigências eram insustentáveis diante daquele jeito simples e meigo de encarar a vida. E com a noite ainda escura, despediu-se de cada plantinha, apanhou alguns copos-de-leite, pegou a pedra... Pendurou a placa na porta e se foi.
2 comentários:
cara... quase chorei... de verdade!!!
lind, lindo... sensível para caralho...
gracias!
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